ARU de Leça do Balio
Aprovada por Deliberação da Assembleia Municipal de Matosinhos, em sessão realizada em 13 de setembro de 2021,, publicada no Diário da República, II Série, n.º 205, de 21 de outubro de 2021, sob o AVISO N. 19857/2021.
Localizada na União das Freguesias de Custóias, Leça do Balio e Guifões, a ARU de Leça do Balio integra-se no território da antiga freguesia de Leça do Balio, que apresenta como limites o concelho da Maia a norte e a este, a freguesia de São Mamede de Infesta a este e a sul e a freguesia de Custóias a Oeste. Dista cerca de dois quilómetros do Porto e seis da cidade de Matosinhos (sede concelhia).
Com uma superfície territorial de 943 hectares e uma população de 17.571 habitantes (Censo 2011), este território compreende os lugares da Agrela, Araújo, Arroteia, Catassol, Custió, Chantre, Fafiães, Gondivai, Goimil, Mainça, Monte da Mina, Monte do Vale, Outeiro, Padrão da Légua, Pintas, Pedregal, Picoutos, Ponte de Moreira, Ponte da Pedra, Queirões, Recarei de Baixo, Recarei de Cima, Rio da Aldeia, Santana, Santeiro, S. Sebastião, Seixo e Souto.
O território delimitado como ARU representa apenas 4,2% da área total da freguesia de Leça do Balio, mas abrange mais de 21% da população residente nesta unidade territorial. Do ponto de vista da ocupação urbana, a ARU de Leça do Balio abarca os aglomerados de Custió, de Pedregal, do Araújo e ainda uma parte da Aldeia dos Lavadores, assumindo uma configuração estreita e estendida ao longo das Ruas de Gondivai, do Araújo e de Custió. Situa-se na envolvente poente
da Via Norte e da EN13 e a norte da A4, sendo ainda cruzada pela Linha de Leixões e pela Linha do Metro do Porto.
É um território muito marcado pela rede viária com reminiscência à ocupação romana da região, “como é o caso da principal estrada romana desta região do Império: a que ligava Olisipo (Lisboa) a Bracara Augusta (Braga). Depois de atravessar o Douro, esta via atravessaria Paranhos, S. Mamede de Infesta e cruzaria o rio Leça já em território desta freguesia, na Ponte da Pedra.
Embora ao longo de quase dois milénios esta ponte tenha sofrido múltiplas intervenções, e o seu aspeto atual seja fundamentalmente medieval, ela é originariamente romana, sendo evidentes na sua estrutura muitas pedras almofadadas” (in “Guia de Leça do Balio”, de Joel Cleto, 1996).
De acordo com a mesma fonte, “uma outra ponte de origem romana existente em Leça do Balio situa-se próximo do Araújo, hoje conhecida como Ponte dos Ronfos e antigamente conhecida como a Ponte da Azenha ou Ponte de S. Miguel de Barreiros. Tal como a Ponte da Pedra, terá sido reconstruída várias vezes em tempos posteriores, mas os vestígios romanos são ainda bem evidentes. Esta Ponte estará relacionada com a «Karraria Antíqua» citada na documentação medieval, que seria uma estrada secundária de origem romana” (…) e que seguiria por Gondivai, Araújo e Custió. “Imediatamente a seguir ao cruzeiro colocado ao lado da Igreja do Araújo pode ainda ver-se um caminho estreito que inicia a descida para a ponte de Barreiros ou da Azenha, resquício certamente da velha estrada. Atravessada a ponte (e atualmente a Via Norte), a «Karraria» subia para o atual centro da Maia”.
Esta herança viária que Leça do Balio herdou da época romana não mais desaparecerá. De facto, uma das principais características deste território foi ter servido sempre de base para a abertura de importantes vias de comunicação de ligação do Porto ao norte litoral.
No que respeita à estrutura do povoamento, “a dominação romana, associada a um significativo desenvolvimento da prática agrícola, promoveu nesta região, particularmente a partir dos séculos III e IV, o aparecimento de um tipo de povoamento disperso que subsistiu praticamente até aos nossos dias. Formaram-se então pequenas comunidades agrícolas mais ou menos isoladas em terrenos férteis, propícios à agricultura. Foram elas a origem, na Alta Idade Média, dos pequenos lugares e paróquias rurais. Foi pois, neste contexto, e uma vez que a freguesia sempre foi conhecida pela riqueza e produtividade das suas terras, que se iniciou a fixação dos
diversos povoados que constituíram Leça do Balio” (in “Guia de Leça do Balio”, de Joel Cleto, 1996).
Outro aspeto central da história urbana deste território está relacionado com a presença do Mosteiro de Leça do Balio (cuja primeira referência histórica data do ano de 1003) cujos limites se estendiam aos territórios das freguesias de Custóias, São Mamede de Infesta, Barreiros (hoje freguesia da Maia) e São Faustino de Gueifães.
A Idade Média reforça a característica de Leça do Balio como um importante local de passagem, não só relacionada com a manutenção da rede existente, mas também da abertura de novas vias associadas às rotas de peregrinação a Santiago de Compostela, com passagem obrigatória no Mosteiro de Leça do Balio.
“A importância de Leça do Balio no dealbar do século XVI, justifica mesmo que, em 4 de junho de 1519, o rei D. Manuel lhe atribua uma carta de Foral (Novo). Mais do que isso, ainda no primeiro quartel desse século, e para fins administrativos, Leça do Balio será mesmo constituída em município, com julgado próprio e composta por três freguesias: a sede, São Mamede de Infesta e Custóias” (in “Guia de Leça do Balio”, de Joel Cleto, 1996), divisão administrativa que se manteve por mais de duzentos anos.
De resto, e recorrendo à mesma fonte, “para lá do seu Mosteiro e da importância das vias que a cruzavam, a freguesia sempre foi caracterizada também pela sua riqueza agrícola. (…) Não admira, pois, que as práticas agrícolas tenham tido sempre uma expressão dominante na vida diária das populações da freguesia até aos nossos dias. Ainda hoje são evidentes, um pouco por todo o lado, vestígios, muitos deles, ainda vivos e em utilização dos ritmos rurais e da cultura material a eles associados. Referimo-nos a espigueiros, moinhos e azenhas no rio Leça, palheiros e cabanas, amplas eiras em casas agrícolas, tradicionais carros de bois e arados (…), que pouco e pouco vão sendo a riqueza destas terras e que explica também o aparecimento de algumas propriedades, possuindo importantes casas solarengas nos seus domínios”, com destaque para (todas elas classificadas como Imóveis de Interesse Público):
- Quinta do Alão, designada também por Quinta de Recarei, já existente nos finais do século XV e que possui um solar seiscentista, com intervenções dos séculos XVII e XVIII;
- Casa senhorial da Quinta do Chantre, projeto de Nicolau Nasoni (século XVIII);
- Quinta de Fafiães.
“O século XVIII foi caracterizado, à semelhança do que aconteceu em tantas outras freguesias da região, por um enriquecimento e entesouramento particularmente evidentes nos edifícios religiosos, e que resulta em grande parte das avultadas riquezas que chegavam então do Brasil, nomeadamente ouro. Não se estranha, portanto, que alguns templos da freguesia vejam nesta época os seus altares e retábulos decorados a talha dourada e que, exteriormente, as suas fachadas sejam objeto de remodelações. Caso, entre outros, da Igreja de S. Pedro, no Araújo, ou da Capela de Nossa Senhora do Desterro, na Quinta de Fafiães” (in “Guia de Leça do Balio”, de Joel Cleto, 1996).
No segundo quartel do séc. XIX, em plena guerra civil entre liberais e absolutistas, “a freguesia foi marcada pelo facto do palacete oitocentista da Quinta da Ponte da Pedra ter servido de residência oficial a D. Miguel durante o Cerco do Porto (1832-33). Na sequência do triunfo liberal, Leça do Balio assiste à extinção das ordens religiosas e, logo, dos privilégios e direitos que a Ordem do Hospital ainda possuía sobre a freguesia” (in idem), sendo integrada no concelho de Bouças em 1835.
“Mas aquela que é uma das principais características de Leça do Balio desde a época romana, o servir de travessia para as principais estradas da região, não deixou de se manifestar igualmente no século XIX. A estrada para a Póvoa, que atravessa Araújo e Custió, é significativamente melhorada, havendo alguns troços que são então rasgados e endireitados”. Em simultâneo, “o desenvolvimento das vias de comunicação e dos transportes públicos veio melhorar o acesso das populações vizinhas às zonas de recreio e lazer da freguesia” (in ibidem).
Por fim, o século XX caracteriza-se por uma “acentuada industrialização, por um significativo desenvolvimento urbano-demográfico e, como não podia deixar de ser, pela abertura de mais uma série de importantes espaços de circulação”. A acompanhar esta tendência está a instalação de um conjunto de unidades fabris ao longo das principais vias de comunicação, que marcam de modo vincado este território (no início muito ligadas aos cortumes e ao têxtil, com destaque para as unidades fabris da Fábrica de Fiação e Tecidos Ponte da Pedra, a Sociedade Portuguesa do Algodão e a Fábrica de Tecidos da Lionesa). Durante a segunda metade do século XX estas três grandes unidades industriais reconvertem a sua atividade e passam a representar três polos fundamentais de emprego neste território. São elas, respetivamente, a UNICER (bebidas), a EFACEC (componentes elétricos) e a SEPSA (metalomecânica).
De igual importância nesta época é o surgimento do caminho de ferro neste território, com a instalação da linha da cintura ou circunvalação de Leixões (que liga a cidade do Porto à zona portuária), com estação na Avenida Dr. Ezequiel de Campos, e a linha de Guimarães (mais precisamente o troço que liga a Senhora da Hora à Trofa, hoje reconvertida na linha do Metro do Porto), com apeadeiro no Araújo.
A crescente taxa motorização das famílias em Portugal durante estas décadas fez com que as necessidades de mobilidade rodoviária continuassem a aumentar, e Leça do Balio, localizado num território já claramente metropolitano, acaba por ver introduzida uma das mais profundas alterações do seu território: a construção da Via Norte durante os anos sessenta do século passado. De acordo com o já citado “Guia de Leça do Balio” (de Joel Cleto, 1996), com esta decisão, a freguesia “pagou um preço elevado. Não só abdicou (…) de uma significativa área agrícola, como se viu dividida por uma autoestrada. Apenas uma passagem permitia, em toda a sua longa extensão, os contactos entre os lados nascente e poente da freguesia, contribuindo para algum virar de costas”. Este cenário foi ainda agravado, já no final do século passado, com a abertura do IP4 (atual A4), introduzindo, desta vez, um novo corte entre os quadrantes norte e sul da freguesia.
É este o contexto histórico-territorial em que se insere a ARU de Leça do Balio, ao qual importa ainda acrescentar a forte evolução demográfica das últimas décadas, fruto da disponibilidade de terrenos para edificação, das boas acessibilidades e do crescimento do cooperativismo de habitação.
Documentos
Proposta de Delimitação da Área de Reabilitação Urbana de Leça do Balio